quarta-feira, 4 de julho de 2012

Aquele nariz

Não pude deixar de fitar o nariz. Talvez fosse o nariz que me olhasse, e não o contrário. A ponta era ligeiramente arredondada, mas o que mais chamava minha atenção era que esse nariz era arrebitado. Cinicamente arrebitado.

Sua dona, uma jovem senhora, levemente arredondada como seu nariz, não sorriu ao me ver. Quando me apresentei muito menos. O carmim da boca era um risco sem expressão. Os olhos também não disseram nada. O nariz, em compensação, continha toda a expressividade que o resto do rosto negava.

Não conversamos. Não havia nada a dizer. Seus olhos e sua boca confirmavam essa falta de assunto, mas o nariz dizia exatamente o contrário. Aquele nariz me inquiria de tal forma intensa que eu poderia admitir qualquer coisa, até o que não fiz, tamanha sua persuasão. Algo me dizia que a qualquer momento poderia ser desmascarada. Eu, vidrada naquele nariz. Por mais que a inquisição muda me incomodasse, não conseguia tirar os olhos daquele nariz tão curioso, arrebitadamente cínico e apaixonante.

A hipnose era tamanha que faria qualquer coisa para ter aquele nariz o mais próximo possível, mesmo que para isso tivesse que me entregar à sua dona, dizer todas as verdades, responder a todas as perguntas. Nada mais importaria, se pudesse enfim me livrar da fixação e da fissura por aquele nariz arrebitado que, de cínico a apaixonante, me conquistou para sempre.

Curitiba, 30 de junho de 2012.

Um comentário:

  1. depois de ler isso percebi q estava escondendo meu nariz. Que perigo já corri sem saber. Ainda bem q o meu é feio e concorre com meu queixo, ufaaaa!!!

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